O TGV verde e encarnado (vermelho, não, nem a falar de comunas, Jesus, credo)
Para mais uma demonstração das agendas políticas dos jornalistas comentadores, o seguinte caso passou-se na TVI 24, no suposto debate de comentadores/jornalistas que se seguiu ao debate entre Manuela Ferreira Leite e Jerónimo de Sousa. António Ribeiro Ferreira, actualmente na equipa do Correio da Manhã, teve como missão ridicularizar o dirigente comunista, enquanto os restantes participantes tomavam o ar de analistas mais sérios, embora favorecendo, claramente, a candidata social-democrata, quanto mais não seja pela atenção não jocosa muito maior que lhe foi dada.
Vejam-se estas declarações de António Ribeiro Ferreira a propósito de Jerónimo e do PCP: “A posição do PC é perfeitamente extraordinária porque eles, hoje, (...) foram à Amadora onde era a Sorefam (...), e o Jerónimo de Sousa diz esta coisa: sim, gosto do TGV, quero o TGV (...), mas quero as carruagens feitas em Portugal, os carris feitos em Portugal, todo o material feito em Portugal. (...) Não existe. Nós fazemos o Tgv, obviamente que as carruagens vêm de fora, os carris, o ferro vem todo de fora e nós temos uma incorporação de mão-de-obra, praticamente. (...) Agora, o que ele quer é a utopia total, não há, não há, deixou de existir, nós não temos ferro, quer dizer, a Siderurgia não há, a fabricação de carruagens, nós não temos há uns anos, e agora ele quer um TGV assim, mas com produtos nacionais. Está bem, então, vamos ter um TGV de plástico, para nós brincarmos todos com TGVs, podemos oferecer às crianças ao lado do Magalhães, um TGVêzinho de plástico (galhofa geral).” Repare-se, pode-se discordar da perspectiva do PCP, contrária à internacionalização da economia e defensora da existência de um forte sector produtivo nacional, nomeadamente um forte sector industrial, mas não faz sentido considerar que é uma utopia total que indústrias que existiam em Portugal ainda há meia dúzia de anos, não possam voltar a existir. Pode-se discordar da perspectiva do PCP que pensa que o Estado deve assegurar a existência de os sectores mais estratégicos da produção nacional, como ocorria até há umas décadas, mas não faz sentido considerar que é impossível algo que já foi possível e com menos custos que muitos empreendimentos megalómanos que têm sido feitos. Ainda menos faz sentido considerar absurdo que se queira produção industrial, siderúrgica, ferroviária, etc., em Portugal – mesmo sem o modelo do PCP, na economia de mercado, qualquer governo deveria desenvolver todos os esforços para voltarmos a ter um razoável sector industrial pesado.
A intenção de António Ribeiro Ferreira não poderia ser mais clara quando ele compara Jerónimo de Sousa com Manuela Ferreira Leite, sempre muito elogiada nestes debates na TVI: “Este discurso de Jerónimo de Sousa não teve uma novidade, até no TGV não tem novidade nenhuma, eles querem um TGV nacional, português, tudo português, pintado de encarnado e verde, e com as quinas, e com bandeiras nacionais, tipo a União Soviética dos velhos tempos, aquelas ideias daquelas inaugurações todas que tinham as bandeiras, o assalto ao Palácio [de Inverno], não sei quê. Portanto, ele não teve uma ideia nova, quando se fala em baixar impostos, ele fica logo nervoso, como a esquerda toda fica nervosa quando se pensa em baixar impostos, ficam logo nervosos, falam logo do investimento público, do Estado, que é preciso não sei quê, ficam logo tudo muito nervoso.” Apesar de dar uma imagem excelente, comparativamente com as expectativas, segundo ele, de Manuela Ferreira Leite, não deixa de ser curioso que não mencionou qual a novidade trazida por ela que contrastaria com a lastimável ausência de novidades de Jerónimo de Sousa.
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