26.10.08

Mais umas falácias - também já com algum mofo

Aqui vai outra série falaciosa, esta sugerida pela minha colega Helena Pimenta. Trata-se da célebre polémica do deserto a propósito do novo aeroporto, iniciada pelas declarações do ministro das Obras Públicas, Mário Lino, em 23 de Maio de 2007, num almoço na Ordem dos Economistas. Há que lembrar que simples falsidades não são falácias – pelo que esta sequência dá mais trabalho do que parece.
Segundo as imagens transmitidas pela SIC, aqui vão as declarações da polémica: “O que eu acho que é faraónico é fazer o aeroporto na margem sul, um aeroporto onde não há gente, onde não há escolas, onde não há hospitais, onde não há cidades, onde não há indústria, onde não há comércio, onde não há hotéis e onde há estudos ambientais da maior relevância que é necessário preservar. Eu recebi as maiores sumidades – ou das maiores sumidades, há outras também muito grandes – mas pessoas de grande competência na área do ambiente, todos eles me disseram, na margem sul, jamais, jamais (com pronúncia francesa).” Mais adiante, em resposta a um interlocutor, introduz a metáfora do cancro do pulmão, onde, após se referir às rotas migratórias das aves e ao aquífero subterrâneo, acrescenta: “também não pode construir o aeroporto onde não há ninguém, pode construí-lo no deserto do Saara, mas é mortal” – entenda-se a metáfora, tal como o referido cancro do pulmão. Houve outras referências hiperbólicas, mas visto não ter tido directo acesso a elas, não as refiro aqui.
Estas declarações provocaram reacções imediatas, nomeadamente, pela sua simples falsidade, pois, segundo o Jornal de Negócios, citando dados do INE, existiriam, na margem sul, 707148 pessoas, 392 escolas (incluindo estabelecimentos do Ensino Superior), 40 hotéis e 20073 estabelecimentos comerciais. Neste artigo, não se referia a indústria, mas certamente não é por ela faltar quer no Barreiro, quer em Setúbal, quer em Palmela, incluindo a menina dos olhos de vários governos, a Auto-Europa.
Para “amenizar” as declarações, o presidente do P.S., António de Almeida Santos, juntou mais uma preciosidade às declarações: “Um aeroporto na margem sul tem um defeito: precisa de pontes. Suponham que uma ponte é dinamitada? Quem quiser criar um grande problema em Portugal, em termos de aviação internacional, desliga o Norte do Sul do país” (segundo o Jornal de Negócios).
Posteriormente, o ministro das Obras Públicas, secundado pelo Ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, corrigiu as suas anteriores declarações, dizendo que só se referia ao local de eventual implantação do aeroporto, Rio Frio ou Poceirão, o que parece ser uma emenda pior que o soneto. Isto equivaleria a dizer que o aeroporto deveria ser implantado numa zona directamente inserida numa área de forte densidade populacional – não poderia ser ao lado, teria que ser na própria zona – o que, para lá de ser novo motivo para polémica, parece mais uma defesa da Portela do que da Ota, visto só a Portela estar inserida numa zona de forte densidade populacional.

21.10.08

Apontamento de AI - O confronto entre as duas concepções de democracia do séc. XX

Este apontamento será, igualmente, entregue aos delegados de turma. De qualquer forma, podem-no descarregar aqui:

11.10.08

Aqui vão outras - estas já a cheirar a mofo

É pena que não tenhamos, por agora, uma campanha eleitoral nacional. Elas são extremamente suculentas em matéria de falácias. Como exemplo, seguem-se dois momentos brilhantes pela sua grosseria da campanha das legislativas de 2005. Infelizmente, não consegui encontrar os registos televisivos destes momentos, pelo que os reconstitui através de artigos do Público, do Diário de Notícias e de blogs.
Ambos ocorreram em Janeiro de 2005, o primeiro em data que não consegui determinar, no final do debate entre Paulo Portas e Francisco Louça, e o segundo em 29 de Janeiro, protagonizado por Santana Lopes e referindo-se a José Sócrates, à saída de um encontro com mais de mil mulheres sociais-democratas ocorrido em Famalicão (em certas fontes, mencionam Braga).
No primeiro, após uma intervenção de Paulo Portas a defender o direito à vida a propósito do aborto, Francisco Louça respondeu: “Não me fale de vida, não tem o direito a falar de vida.” E após uma réplica de Paulo Portas, insistiu: “O senhor não sabe o que é gerar uma vida. Não tem a mínima ideia do que isso é. Eu tenho uma filha. Sei o que é o sorriso de uma criança. Sei o que é gerar uma vida.”
No segundo, após um almoço com mulheres sociais-democratas onde foram especialmente focados os temas do casamento dos homossexuais e da adopção por homossexuais, e onde Santana Lopes já havia feito diversas alusões crípticas, entre as quais: “as características pessoais dos líderes partidários, no que não respeita a questões políticas, não nos interessam”; “não entrem por esse caminho, porque se nós quisermos entrar por aí, isto entra num nível que não é do meu agrado”; “é bom que digamos o que cada um é, o que cada um fez e o que cada um se propõe fazer”, etc.; num contexto de boatos sobre José Sócrates, apimentado com diversos comentários das intervenientes femininas do encontro, em resposta a uma questão jornalística sobre o significado daquele encontro com mulheres, Santana Lopes afirmou: “O outro candidato tem outros colos, estes colos sabem bem.”

Aqui vai a primeira - fresquinha

Em entrevista centrada na crise financeira actual, no dia 8 de Outubro de 2008, na SICNotícias, pelas 22.42, Jorge Braga de Macedo declarou: “Neste momento, há um esforço essencial em explicar aquilo que é o perigo – que é a falta de coerência [nas medidas dos vários países para combater a crise] – e aquilo que pode parecer um drama no curto prazo mas se vai resolver, porque, de facto, aquilo que aconteceu nos anos 30 não se vai repetir, eu tenho a certeza absoluta que não vai haver o tipo de falências bancárias que houve nos Estados Unidos nos anos 30. Porquê? Porque foi a última guerra, essa não se vai repetir. Já, pelo contrário, a ligação com os investidores institucionais, a bolsa, o acesso do cidadão e das empresas ao crédito, eu aí tenho receio.”
Embora o caso já esteja estabelecido, talvez os pedaços seguintes possam contribuir para o esclarecimento da argumentação e/ou da sua intenção. Logo a seguir, às 22.43: “Insisto, aquilo que foi o drama dos anos 30, a miséria intensa não é o problema agora. O problema agora é a economia mundial, pela primeira vez, não conseguir crescer. E porquê?” Segue-se uma explicação que recorre à globalização, nomeadamente com a baixa dos preços devido à produção e criação de riqueza na China e na Índia que teria levado à complacência em relação à inflação, nomeadamente, fazendo crer que os preços das casas não parariam de subir.
Mais adiante, pelas 22.49: “A ideia de que o Estado agora passa a resolver tudo porque, aspas, o neo-liberalismo falhou, fecha aspas, é ideologia sem nenhum interesse para resolver os problemas concretos. Quem, portanto, perceber é: aquilo que aconteceu nos anos 30 não vai voltar a acontecer. Quer isso dizer que não haverá problemas? Não, há novos problemas e [para] esses novos problemas temos que estar atentos e pensar, temos que os resolver com coerência – essa coerência tem falhado, tem falhado nos Estados Unidos, tem falhado na Europa."

As falácias dos políticos

Na sequência da proposta inicial de um trabalho de projecto centrado nas falácias dos políticos (e figuras que tenham importância política - jornalistas, comentadores, agentes económicos, etc.), tendo em conta que muitos alunos não têm qualquer hábito de contacto com os meios de comunicação que veiculam este tipo de argumentação, decidi colocar aqui no blog os casos que consiga registar de falácias óbvias, sem, no entanto, as identificar e, muito menos, as analisar e sem fornecer qualquer informação acerca da biografia da figura em causa. Assim, quem decida tratar tal falácia ou tais falácias ainda terá trabalho para fazer. Quem decida fazê-lo, terá que reservar, junto de mim, o tema. Não aceito trabalhos não combinados e/ou que repitam outros trabalhos. Obviamente, quem consiga fazer o trabalho integralmente por si terá uma valorização específica. Os trabalhos deverão ser individuais, a não ser que atinjam um porte e uma complexidade muito maior que a mera análise de uma pequena falácia e a respectiva biografia do responsável por ela.
Quanto aos casos que aqui colocar, vou cingir-me àqueles que possa transmitir com rigor. Ainda ontem de manhã testemunhei uma falácia grosseira num debate sobre os casamentos homossexuais, mas como não a transcrevi nem sequer sei qual o nome do responsável por ela, não a vou transpor para o blog. Os alunos que se deparem com falácias devem também me comunicar a sua intenção de as abordar porque podem existir outros que já as tenham reservado - há casos que são tão notórios que muita gente dá conta deles. Além disso, podem nem ter a certeza de se tratarem, de facto, de falácias. Podem, também, se considerar livres para utilizar o blog para proporem eventuais falácias, para discutirem que tipo de falácia ou falácias se tratará ou se se tratará, de facto, de uma falácia. Há que salientar, finalmente que, por enquanto, nos devemos cingir à detecção, visto ainda não ter ocorrido a leccionação respectiva, reservando para mais tarde a identificação e análise.